Cinquenta por cento de lei

AutorArnaldo Ourique
Páginas75-76

Page 75

Na Revisão de 2004 da Constituição Portuguesa, foi alterado o artº 228º que previa textualmente um vasto conjunto de matérias que a região autónoma podia legislar.45 Em seu lugar o artº 228º, agora epigrafado de Autonomia Legislativa passou (num nº 1, a repetir a alínea A do nº 1 do artº 227º, e) num nº 2, a ter o seguinte texto:

Na falta de legislação regional própria sobre matéria não reservada à competência dos órgãos de soberania, aplicam-se nas regiões autónomas as normas legais em vigor.

É uma das disposições legais da Constituição mais emblemáticas da penúltima revisão, infelizmente pelo lado negativo.

Já o nº 1 lido em conjunto com a citada A do artº 227º diz muita coisa (e sobre isso já escrevemos noutro lugar).

Mas importante mesmo é o nº 2 que é em si mesmo representa metade da malfeita alteração ao sistema autonómico em 2004. E começa desde logo num conceito que, como conceito, não existe: a legislação regional própria. Existe legislação regional de origem autonómica, e dizendo própria ao querer expressar "própria de cada região autónoma", encaminha o intérprete para uma nomenclatura errada, ineficaz e sobretudo inútil: errada, porque a expressão correcta é "legislação das regiões autónomas" porque é a condizente com o seu estatuto político; ineficaz porque utiliza "regional" conceito confuso, porque o termo é universal no país (administração regional estadual nas regiões autónomas e no continente) e, repara-se, já não é "assembleia legislativa regional" mas "Assembleia Legislativa". E inútil, porque a expressão "própria" pode levar a questionar-se se o é referente a cada região autónoma ou se alusivo à competência constitucional de cada uma ou se concernente à "própria" matéria em causa.

Mas, e mais importante ainda: o princípio da aplicação da lei estadual na região autónoma quando sobre a matéria concorrencial não exista lei de origem autonómica. Este é um princípio que nunca esteve escrito na letra da Constituição, mas que, quer por força do sistema, quer até por sermos um Estado unitário, existia e com naturalidade. A sua inserção no texto constitucional é um estilo de mensagem às regiões autónomas que julgava termos há muito ultrapassado. É muito evidente que a legislação do Estado é aplicada ao território...

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