Contratos à distância - o contrato de seguro -

AutorMário FROTA
CargoDirector do Centro de Estudos de Direito do Consumo
1. Generalidades

A Directiva 2002/65/CE do Parlamento e do Conselho da União Europeia, adoptada em 23 de Setembro de 2002 e que ora vem a lume (Jornal Oficial de 9 de Outubro de 2002), institui o regime dos serviços financeiros à distância, após anos de intenso e profícuo debate.

O futuro abre-se, na realidade, aos seguros celebrados através de contratos telemáticos.

Nos considerandos, os serviços financeiros à distância surgem como uma das mais marcantes manifestações na edificação do mercado interno.

Os serviços financeiros não se restringem, porém, aos seguros: abrangem de análogo modo os serviços bancários em geral, os de crédito em particular, os de pensões individuais, de investimento e as operações de pagamento.

O segmento dos seguros constitui indubitavelmente um dos mais relevantes.

O espaço económico e social em que Portugal institucionalmente se insere só se justificará se um consumidor no Porto, em Valença ou em Aljezur puder, sem restrições, celebrar contratos com empresários ou sociedades mercantis de Helsínquia, de Dublin, de Roterdão…

O regime que ora se institui assenta no pressuposto de que "é do interesse dos consumidores aceder sem discriminações à mais ampla gama de serviços financeiros disponíveis na comunidade, de modo a poderem escolher os que mais se adequem às suas necessidades".

E por forma a garantir-se a "liberdade de escolha dos consumidores", que é direito fundamental, indispensável se torna assegurar-lhes um elevado nível de protecção.

Só um elevado nível de protecção é susceptível de garantir o reforço da confiança do consumidor nas negociações entretecidas à distância.

Os contratos telemáticos em um espaço económico alargado pressupõem a observância estrita de um sistema de informação objectivo, transparente, rigoroso.

O consentimento perfeito, livre, esclarecido e ponderado depende, num dos seus vectores, do acesso a uma informação fidedigna, séria, adequada e a instrumentos eficazes de salvaguarda dos interesses económicos do consumidor, quinhão inestimável do seu estatuto.

A directiva ora adoptada vai nesse sentido e é, pois, prenúncio de devir.

O mercado interno não se construirá se tudo se confinar às "fronteiras" da geografia convencional dos Estados-nação que constituem o "corpus" da Comunidade Europeia.

Daí que a filosofia subjacente seja a de estimular actividades económico-financeiras que se espraiem muros adentro das fronteiras físicas do Mercado Comum e de prevenir ou esbater os conflitos mediante regras precisas cuja observância se impõe, sejam quais forem as circunstâncias.

2. Requisitos de fundo: o consentimento

No quadro do consentimento prestado pelo consumidor ante a oferta dos serviços financeiros à distância, pontos de fixação do sistema há em que importa atentar:

- proibição de serviços financeiros não solicitados

- esclarecimento, informação, tanto pré-contratual, como contratual

- ponderação ou reflexão em vista do direito de arrependimento ou desistência

- precauções em matéria de pagamentos

- conflitos e sua resolução.

Ao debruçarmo-nos, elementarmente, sobre tais elementos, destacaremos:

2.1. "Serviços financeiros forçados"

Sem prejuízo de disposições que contemplem a prorrogação tácita dos contratos telemáticos e os mais que por objecto tenham os serviços financeiros, as instâncias legiferantes da União estabelecem imperativamente

- a proibição de se prestarem serviços financeiros forçados, vale dizer, serviços que não hajam sido previamente solicitados pelo consumidor, sempre que incluam um qualquer pagamento imediato ou diferido;

- a dispensa de qualquer obrigação que impenda sobre o consumidor em caso de prestação forçada, impondo-se se considere que o silêncio do consumidor (a sua não reacção a qualquer proposta, ainda que com prazo definido) não constitui tácita aceitação (ex: se não responder em oito dias, considera-se aceitas as condições do contrato…).

2.2. A informação preliminar

O normativo europeu estabelece inequivocamente que a informação a dispensar ao consumidor em momento anterior ao da celebração do contrato deva incidir sobre quatro pontos essenciais:

- prestador

- serviço financeiro

- conteúdo do contrato

- vias jurisdicionais e meios processuais idóneos por forma a dirimir-se os litígios eventualmente suscitados.

No que toca ao prestador:

- a identidade e actividade principal do prestador, endereço geográfico do seu estabelecimentos e qualquer outro relevante para as relações cliente / prestador;

- a identidade do representante do prestador no Estado-membro de residência do consumidor e o endereço geográfico relevante para as relações consumidor / representante, quando exista;

- identidade do profissional distinto do prestador, quando o haja, a qualidade em que trata com o consumidor e o endereço geográfico para as relações cliente / profissional;

- número de inscrição no registo comercial ou forma de identificação equivalente no registo;

- se dependente de autorização a actividade do prestador, os elementos relevantes.

2.3. No que se reporta aos serviços financeiros, destaque para

- preço do serviço financeiro na sua globalidade, nele se incluindo comissões, encargos, despesas inerentes, impostos e taxas ou, se tal se revelar impossível, a base de cálculo que permita o seu domínio pelo consumidor;

- se for o caso, indicação dos riscos especiais coenvolvidos nas operações a executar ou cujo preço dependa de flutuações dos mercados financeiros fora do controlo do prestador e cujos resultados pretéritos não constituam índice de resultados futuros;

- referência a outros e eventuais impostos e / ou custos insusceptíveis de recair sobre o prestador ou por si facturados;

- limite de validade do período a que se reportam as informações prestadas;

- modos de pagamento e execução;

- custos adicionais que impendam sobre o consumidor decorrentes dos meios de comunicação à distância, sempre que facturados.

2.4. No que em particular se refere ao contrato à distância

- direito de retractação, sua duração e condições de exercício, montantes exigíveis caso os serviços sejam de imediato executados, e na proporção em que o forem, e as consequências emergentes do não exercício do direito de...

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