Porquê Estatuto e não Constituição? (III/III)

AutorArnaldo Ourique
Cargo do AutorLicenciado, Pós-Graduado e Mestre em Direito, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Páginas72-74
72
2.25 Porquê Estatuto e não Constituição? (III/III) (
28)
Nos dois textos anteriores vimos vários sentidos do problema. Vamos finalizar.
Perguntávamos se não seria admissível designar o Estatuto por Constituição. Pelas
conclusões finais temos aqui já uma resposta: não Constituição porque esta tem uma
abrangência ampla, diferente da matriz eminentemente territorial do Estatuto. Mas a
questão persiste porque o Estatuto é lei de governação.
A ordem jurídica portuguesa possui um princípio geral de direito segundo o qual “a lei
geral não revoga a lei especial”. Tal princípio consta do Código Civil. Esse princípio tem
duas ramificações importantes: é assim se a lei geral não o disser inequivocamente e desde
que essa lei geral tenha valor paramétrico igual ou superior à lei especial; vamo-nos manter
na parte essencial do princípio de que a geral não revoga a especial.
A propósito das regiões autónomas, sobretudo pela profunda alteração de sistema
legislativo autonómico produzida pela Revisão Constitucional de 2004, o princípio de que
a lei geral não revoga a lei especial ganhou relevo na doutrina portuguesa para
fundamentar que as leis dos estatutos político-administrativos, sendo especiais face às
gerais, não podem ser revogadas ou derrogadas por outras leis de valor idêntico. É um erro
técnico admitir que a não revogação ou derrogação do Estatuto Político-Administrativo,
seja impedido por via do princípio da lei geral/lei especial: o procedimento especial, e não
o tipo de maioria de aprovação da lei, previsto na Constituição mostra por si só que se trata
duma lei que, das duas uma: ou é revogada ou derrogada por lei constitucional, portanto lei
de valor superior, ou apenas pode sofrer tais cortes através da iniciativa dos parlamentos
regionais.
Este princípio de lei geral/especial tinha uma dimensão antes de 1976 que com a
introdução da 3ª República, da Constituição Democrática e da instituição das regiões
autónomas e respetivo modelo de poder legislativo, deixou de possuir. O Estado passou de
unitário para unitário regional. Isto é, enquanto que antes de 1976 as regras gerais do
ordenamento jurídico se cingiam sobretudo aos aspetos civilistas da ordem jurídica, a partir
daí a Constituição passou a constituir um fator decisivo na parametrização, até hierárquica,
28 Publicado em 09-10-2011.

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