Historiando

AutorHelder Martins Leitão
Cargo do AutorAdvogado Almeida & Leitão, Lda. , 2008
Páginas11-17

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No direito antigo o que hoje é petição - com alguma diversidade - chamava-se libelo.

O acto pelo qual o autor propõe por escrito, e articuladamente, a espécie da questão que se há-de tratar em juízo, e conclui pela condenação do réu. 1

Eis, pois, o libelo como base e fundamento do processo. Na vigência do código adjectivo de 1876, o seu art. 394.º, equacionava:

Toda a acção terá por base uma petição em que o autor, requerendo a citação do réu, deduzirá os fundamentos da sua acção, concluindo pelo pedido

.

No Código de Processo Civil de 1939, 2 o art. 480.º pontificava:

A instância inicia-se por uma petição em que o autor exporá os fundamentos e o objecto da sua pretensão

.

Cotejadas as noções sobreditas, podem-se visionar elementos comuns e elementos diferenciais, no dizer de Alberto dos Reis. 3

Os elementos comuns são os fundamentos e o objecto da pretensão do autor. A diferença é esta: ao passo que a petição inicial, tanto no Código de 1939, como no Código de 1876, tem por função dar começo à instância, no direito antigo esse papel cabia, não ao libelo, mas à citação do réu.

Com efeito, o autor começava por requerer a citação do réu; com o acto da citação iniciava-se a instância; posteriormente a isto, é que o autor oferecia o libelo, no qual identificava o litígio para que requerera a citação.

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O autor chamava primeiro o réu a juízo (vocatio in jus); depois é que lhe dizia para que o chamara, apresentando o libelo em que expunha o objecto e fundamento da acção (edictio actionis). 4

Em 1876, editado o Código de Processo Civil, terminou tão estranho sistema. A instância inicia-se em simultâneo com a vocatio in jus e a edictio actionis. E, assim, na petição passou a cumular-se: exposição dos fundamentos da acção com formulação do respectivo pedido e requerimento da citação do réu.

No Código de 1939, porém, deixou-se cair a exigência do requerimento da citação do réu. 5

Competiria ao juiz, não indeferisse in limine a petição, ordenar a citação do demandado.

Um triplo objectivo integrava o petitório, 6 a saber:

- iniciador da instância

- fundamentação do pretendido pelo demandante

e

- designação do objecto.

Sendo que Guasp 7 procurou distinguir o conceito de demanda do conceito de pretensão processual.

Aquela, seria um simples acto de iniciação processual; esta, uma declaração de vontade.

Naquela, o autor pede 8 que se dê início a um processo; nesta, o declarante solicita determinada e concreta actuação do órgão jurisdicional.

Estes dois actos aparecem fundidos a maior parte das vezes; o autor requer o começo do processo e, simultaneamente, formula a pretensão que há-de constituir o objecto dele.

Mas, simultaneidade temporal não implica identificação. Por se praticarem ao mesmo tempo, não se segue que os dois actos se confundam. Seja: a petição inicial exerce, por si, o papel que no nosso antigo direito competia à vocatio in jus, ao requerimento para citação do réu, ao passo que a pretensão processual desempenha o papel que nas Ordenações e na Nova Reforma Judicial cabia ao libelo (edictio actionis).

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Ante a pergunta sobre o porquê da fusão dos dois actos, responde o mesmo Guasp: 9

porque não faz sentido que uma parte do processo se passe no vácuo.

Se o processo começasse sem se saber qual a pretensão que o autor se propunha fazer valer, ter-se-ia um processo sem objecto, visto ser a pretensão do autor o que define o objecto inicial do processo.

Para quê chamar o réu a juízo, sem lhe indicar o fim? As três finalidades apontadas no art. 480.º do C.P.C. de 1939, condensou-as Alberto dos Reis, 10 deste modo:

- a petição inicial serve para propor a acção.

Efectivamente, com o acto da proposição da acção, dá-se início à instância (art. 267.º) e, ao mesmo tempo, caracteriza-se a acção respectiva.

Ora, uma acção caracteriza-se ou identifica-se mediante a designação dos sujeitos, do objecto e da causa (art. 502.º).

O que se pretendia com o vertido no corpo do art. 480.º do C.P.C. de 1939, 11 era relevar as duas funções primaciais do petitório: a enunciação do objecto e a causa da pretensão do autor.

O objectivo da petição era (e é) o de dar início à instância. Esta, efectivamente, só começa, só se consubstancia, quando e se o petitório é apresentado (e recebido, já se vê) na secretaria.

Antes deste concreto acto, há quando muito uma intenção, mas não uma petição, que só o será, constituindo como que motor de arranque da instância (da acção), quando com recepção admitida pela secretaria.

Altura em que, efectivamente, ganha relevância processual, como uma das suas peças fundamentais, quando não mesmo a principal...

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