Parecer DO Comité Económico e Social Europeu sobre o "Livro Verde relativo à transformação da Convenção de Roma de 1980 sobre a lei aplicável às obrigações contratuais num instrumento comunitário e sua modernização" COM(2002) 654 final

Bruxelas, 29 de Janeiro de 2004

Em 14 de Janeiro de 2003, a Comissão decidiu consultar o Comité Económico e Social Europeu nos termos do artigo 262.° do Tratado CE sobre o

"Livro Verde relativo à transformação da Convenção de Roma de 1980 sobre a lei aplicável às obrigações contratuais num instrumento comunitário e sua modernização" COM(2002) 654 final.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 12 de Novembro de 2003, sendo relator J. PEGADO LIZ.

Na 405ª reunião plenária de 28 e 29 de Janeiro de 2004 (sessão de 29 de Janeiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 65 votos a favor e 1 abstenção, o seguinte parecer.

I Introdução
A) Objectivos, razão de ser e oportunidade da iniciativa da comissão

1.1. O principal objectivo assumido pela Comissão com a apresentação do Livro Verde relativo à transformação da Convenção de Roma de 1980 sobre a lei aplicável às obrigações contratuais num instrumento comunitário e sua modernização [COM(2002) 654 final de 14/01/2003], adiante designado simplesmente como "Livro Verde", foi "lançar uma ampla consulta dos meios interessados sobre um certo número de questões de ordem jurídica", relativas àquela transformação e modernização, abstendo-se, formalmente, de tomar "qualquer posição sobre a necessidade de modernizar a Convenção de Roma ou de a transformar num instrumento comunitário".

1.2. O Comité, ao contrário, entende, desde já, no âmbito das suas competências próprias, como órgão consultivo, expressar a sua opinião favorável quanto ao princípio da transformação da Convenção de Roma em instrumento comunitário, bem como à actualização das suas disposições, com a plena consciência de que assume, assim, plenamente o seu papel consultivo em domínio fundamental não só para a regulação de aspectos essenciais de realização do mercado interno, mas também, e fundamentalmente, para a criação de uma sociedade civil europeia em aspecto essencial do espaço de liberdade, de segurança e de justiça1.

1.3. Em vários dos seus pareceres, o Comité já se tem pronunciado pela conveniência de uma reflexão sobre a actualidade dos preceitos da Convenção de Roma e sobre as várias dificuldades encontradas na sua aplicação, a propósito de vários aspectos gerais ou sectoriais2.

1.4. Também quanto à sua transformação em instrumento comunitário, com as novas possibilidades criadas pelo Tratado de Amesterdão no que se refere à criação de um espaço de liberdade, de segurança e de justiça, desenvolvidas no Plano de Acção de Viena, adoptado pelo Conselho em 19983, e concretizadas no Conselho Europeu de Tampere de Outubro de 1999, o Comité não pode, a este propósito, senão repetir o que deixara já sublinhado nos seus pareceres sobre a transformação da Convenção de Bruxelas em instrumento comunitário, o actual Regulamento CE 44/2001 de 22/01/20004, bem como sobre a Comunicação da Comissão relativa ao direito europeu dos contratos5.

1.4.1. No primeiro desses pareceres afirmou-se designadamente, que "o Comité saúda desde logo o facto de a Comissão ter decidido transformar a Convenção em projecto de regulamento" representando "um regulamento de aplicação directa (…) um progresso notável, nomeadamente na medida em que traz mais segurança jurídica (…) e que o Tribunal de Justiça poderá assegurar uma aplicação uniforme das disposições do regulamento em todos os Estados-Membros".

1.4.2. No segundo dos mencionados pareceres afirma-se que "é inegável que os operadores internacionais sentem a necessidade de um quadro universal utilizável, estável e previsível que favoreça a segurança e a lealdade das operações bem como o acatamento das disposições e princípios de ordem pública internacional inscritos nas grandes convenções internacionais e no direito consuetudinário".

1.4.3. O Comité retoma, assim, a propósito da presente iniciativa da Comissão, exactamente o sentido favorável que expressou relativamente à transformação da Convenção de Bruxelas em regulamento comunitário, e salienta, inclusivamente, a necessidade de coerência jurídica, que aponta para uma solução de idêntica natureza.

1.5. O Comité entende, aliás, que a Comissão já possui elementos suficientes, recolhidos em diversas instâncias6 e, nomeadamente em pareceres do CESE já citados, que lhe permitem avançar na concretização de uma iniciativa que, não só tem toda a razão de ser, como considerações de oportunidade ligadas até com a próxima adesão de mais dez países membros levam a aconselhar que não seja protelada no tempo.

1.6. Com efeito, os progressos já realizados ou em vias de concretização, em domínios substantivos e processuais, como sejam, para além de outros7, a Comunicação da Comissão sobre o direito europeu dos contratos8 e o instrumento Roma II sobre a lei aplicável às obrigações extracontratuais9, aconselham minimamente a que todos os aspectos do direito internacional privado (DIP) constantes dos vários instrumentos e documentos referidos sejam concatenados sistematicamente num instrumento único, directamente aplicável em todos os Estados-Membros, como forma de garantir uma aplicação uniforme das mesmas normas de conflitos em todos os Estados-Membros.

B) O impacto socioeconómico da iniciativa

1.7. Para além dos aspectos eminentemente técnico-jurídicos, que resultam da actualização e transformação da Convenção de Roma em instrumento comunitário, a Comissão preocupa-se acertadamente com o impacto socioeconómico da iniciativa, a propósito de várias questões suscitadas com a aplicação de várias disposições de tal instrumento.

1.8. O Comité acompanha a preocupação da Comissão e não deixa, em relação à apreciação que faz das sugestões de actualização do articulado da Convenção, de tomar em consideração os elementos disponíveis sobre o impacto das medidas preconizadas, em particular no que se refere a aspectos sectoriais como os seguros, os arrendamentos ou o direito de trabalho, ou, ainda, em relação às empresas, em especial as pequenas ou médias empresas e aos consumidores.

1.9. No entanto, e de uma forma geral, o Comité quer, desde já, manifestar a sua convicção de que uma actualização do dispositivo de DIP, consolidado num único instrumento comunitário, terá um impacto extremamente positivo nas relações económicas e sociais no espaço comunitário, na medida em que contribui para a uniformidade das regras de conflitos e é, assim, gerador de segurança e de confiança.

1.10. O bom funcionamento do mercado interno, mais precisamente, a liberdade de circulação e o direito de estabelecimento de pessoas singulares e colectivas, exige o aprofundamento da segurança jurídica, o que, implicando a estabilidade das relações jurídicas, levará à necessidade de um igual tratamento destas relações em qualquer dos Estados da União Europeia (ainda que com os limites óbvios da ordem pública ditada em cada Estado).

1.10.1. Tal desiderato desdobrar-se-á na protecção das legítimas expectativas de quantos se envolvem em relações contratuais plurilocalizadas, o que passará também pela garantia da certeza do direito aplicável às mesmas. Tal estabilidade, por outro lado, sempre lucrará quando se conseguir a uniformidade de valoração das situações jurídicas e das relações contratuais nos diversos Estados da União. Ora, o caminho para essa uniformidade é, sem dúvida, franqueado pela unificação das regras de conflitos, daquelas regras que vêm prevenir ou dirimir os conflitos de leis no espaço.

1.10.2. Consegue-se desta sorte uma visão unívoca da mesma relação, firmando a segurança jurídica quanto ao modo como a mesma há-de ser disciplinada, com o óbvio benefício para a programação da vida comercial e para a extensão geográfica da mesma, agora despida dos receios de alteração da disciplina das relações contratuais10. Evita-se, a par disso, o fenómeno designado de forum shopping11.

1.10.3. Além disso, a unificação das regras de conflitos propiciará uma previsibilidade reforçada quanto à disciplina que há-de reger as relações contratuais entre particulares, o que não deixará de contribuir para a agilização e a maior pujança da vida comercial, pois que os intervenientes, se menos receosos quanto ao porvir das suas relações, tornar-se-ão mais afoitos12.

C) Questões metodológicas; o questionário

1.11. O Livro Verde está fundamentalmente dirigido aos técnicos do Direito, em particular às Universidades e aos magistrados, às empresas e aos organismos e associações de protecção e defesa dos cidadãos, designadamente os consumidores. É nessa perspectiva que faz todo o sentido o questionário proposto, o qual cobre, de forma quase exaustiva, as questões suscitadas pela aplicação da Convenção de Roma.

1.12. Por seu lado, o Comité entende agrupar as questões suscitadas por grandes temas, distinguindo, de um lado, as questões gerais das propostas de especialidade, e assim organiza o presente parecer.

1.13. Atendendo às amplas informações doutrinais e jurisprudenciais facultadas pelo Livro Verde, a fim de justificar as diferentes questões que a CR pode levantar, e de fundamentar as soluções oferecidas em alternativa, brevitatis causa, o Comité não reproduz todos os argumentos mobilizáveis, atendo-se, por vezes, a coligir as vantagens das vias de solução que propõe.

1.14. No entanto, o Comité procura, em síntese final, dar uma resposta concisa a todas e a cada uma das questões postas pela Comissão, sem embargo de se permitir suscitar ainda outras questões e de formular recomendações quanto ao futuro trabalho da Comissão, no intuito de contribuir para...

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