Acórdão de 6 de Novembro de 2003 do Tribunal da Relação de Lisboa

II - Essa desproporção não deve ser aferida perante o caso concreto, mas tendo como referentes os interesses típicos do circulo de pessoas normalmente implicadas em negócios da mesma espécie, ou seja, na fórmula utilizada pelo legislador, "consoante o quadro negocial padronizado".

III - Se num contrato de aluguer de longa duração esta prevista uma cláusula penal, segundo a qual a locadora em caso de incumprimento além de poder resolver o contrato, tem direito a uma indemnização nunca inferior a 75% do valor das remunerações acordadas, e a prestação duma caução que revertera na sua totalidade para a locadora em caso de incumprimento do contrato pela locatária, estamos perante uma duplicação de sanções que se revela desproporcionada aos danos a ressarcir neste tipo de contratos.

IV - Perante esta desproporção deve declarar-se nula a cláusula que determina que o montante da caução reverta para a locadora em caso de incumprimento do contrato pela locatária.

Acordam na Secção Cível (2ª Secção) do Tribunal da Relação de Lisboa:

I - "Sagrup - Rent, Aluguer de Automóveis, SA", intentou a presente acção declarativa com processo sumário contra "Teletoro - Comércio de Madeiras, Lda.", Jaime Carvalho Sousa Neto António Manuel Soares de Almeida Cardoso e Carlos Paulo Conchinha Palmeiro.

Pediu a A. a condenação solidária dos RR. a pagarem-lhe a quantia de 525.399$00 de alugueres vencidos, acrescidos de juros de mora vencidos até 08/08/95 no montante de 44.263$10, bem como os juros vincendos sobre 525.399$00, à taxa de 15% até integral pagamento, e, ainda, uma indemnização no montante de 869.224$50 e os juros que à taxa de 15% se vencerem desde a citação dos RR. até integral pagamento.

Os RR. foram citados - sendo que o R. António Manuel Soares Cardoso o foi editalmente, mas veio a constituir advogado e interveio no processo (fls. 60 e 61). A. R. "Teletoro Lda." apresentou contestação.

A A. respondeu à contestação.

A acção prosseguiu os respectivos termos vindo a ser proferida sentença que:

  1. condenou os RR. a solidariamente pagarem à A. 2620,68 euros (525.399$00) de alugueres vencidos, acrescidos de juros de mora vencidos desde o vencimento de cada aluguer até 14/05/95, bem como numa indemnização no montante de 4.335,67 euros(869.224$50), abatendo a estes valores o valor da caução entregue pela 1.ª R. e acrescido o remanescente de juros à taxa de 15% e de 12% desde 17/04/99 (Portaria n.° 262/99) até integral pagamento; b) absolveu os RR. do demais peticionado c) declarou improcedente o pedido reconvencional.

Desta sentença recorreu a A.

II - A matéria de facto considerada provada pelo Tribunal de 1.ª instância é a seguinte:

1 - A R. pretendia adquirir o veículo automóvel marca Opel, modelo Corsa, com a matrícula 86-49-CR, tendo para o efeito contactado a firma "Humberto Delgado, Lda".

2 - Como a dita R. não se dispusesse ou não pudesse pagar de pronto o do dito veículo, solicitou à dita "Humberto Delgado, Lda.", esta possibilitar-lhe o aluguer do mesmo por um período de três anos com a colaboração ou intervenção da ora A. para tal.

3 - Na sequência do que lhe foi solicitado pela dita "Humberto Delgado Lda." por ela e em nome da dita sociedade R., a A. adquiriu, com destino a dar de aluguer à dita R., o referido veículo automóvel.

4 - Por contrato particular, datado de 15 de Outubro de 1993, a A. deu de aluguer à R. o dito veículo.

5 - O prazo de aluguer foi de trinta e seis meses, sendo mensal a periodicidade dos alugueres, num total de trinta e seis, no montante de Esc. 74.689$00 cada, incluindo já o respectivo IVA.

6 - O dito preço mensal do aluguer, de Esc. 74.689$00, correspondia a Esc. 64.387$00 de aluguer propriamente dito, mais Esc. 10.302$00 de IVA, sendo que, o IVA passou a ser à taxa de 17% a partir de 1 de Janeiro de 1995, e assim no montante de 10.946$00, ficando o valor do aluguer elevado a Esc. 75.333$00.

7 - De harmonia com o acordado, a importância de cada um dos referidos alugueres deveria ser pago pela ora R. à A. antecipadamente até ao dia 15 do mês a que respeitasse, por meio de transferência bancária.

8 - Após a celebração do referido contrato, a dita R. recebeu o veículo referido, que passou a utilizar, veículo que para o efeito, a A. propositadamente adquirira.

9 - A partir do décimo segundo aluguer, inclusive, que se venceu em 15 de Outubro de 1994, a R. deixou de pagar os alugueres acordados.

10 - Nos termos e condições gerais do referido contrato, o facto referido na alínea anterior, implicou a resolução imediata e automática do mesmo, nos precisos termos acordados, como a A. o fez saber à R., após inúmeras vezes lhe ter solicitado o pagamento dos alugueres em débito, por carta datada de 4 de Maio de 1995.

11 - Operou-se assim a resolução do dito contrato nos termos contratuais, tendo a A. conseguido recuperar o dito veículo, em 11-05-95.

12 - Os RR. Jaime, António e Carlos, assumiram com carácter de fiança solidária, a posição de fiadores e principais pagadores da dita sociedade R., para com a A., com referência às obrigações do contrato referido.

13 - A R. "Teletoro, Lda.", entregou à A., 4 cheques, sacados sobre a Nova Rede, Agência de Setúbal, nas datas e seguintes valores:

- Em 13-02-95, Esc. 99.370$00;

- em 27-02-95, Esc. 232.704$00;

- em 11-03-95, Esc. 232.704$00 e

- em 1-03-95, Esc. 232.704$00, de forma a pagar todos os atrasos de Outubro de 94 até Abril de 1995.

14 - A R. Teletoro, entregou como caução o montante de Esc. 794.467$00.

15 - Apresentados os ditos cheques a pagamento, nas datas dos respectivos vencimentos, nenhum deles foi pago, vindo todos a ser...

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