Sociedades gestoras de participações sociais: tendências actuais

AutorTiago Caiado Guerreiro
Cargo do AutorAdvogado
Páginas11-54

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1. A Sociedade Gestora de Participações Sociais (SGPS) Breve Introdução

Em 1988 foi criado o regime legal da primeira sociedade holding portuguesa - a Sociedade Gestora de Participações Sociais (doravante designada por SGPS).

A criação das SGPS surge num contexto de preparação para a integração no mercado único europeu, em que se tornava imprescindível o fortalecimento do tecido empresarial português, tarefa para a qual as sociedades de controlo então existentes (Decreto-Lei 271/72, de 2 de Agosto) se mostravam obsoletas.

Ora, para tornar as empresas portuguesas mais fortes e mais capazes de enfrentar a forte concorrência externa que se iria sentir com abolição das fronteiras no interior do mercado europeu, era necessário incentivar a criação de grupos económicos. Para isso era necessário criar um instrumento mais flexível e eficiente que permitisse a gestão centralizada e especializada de participações sociais - a SGPS.Page 12

A SGPS pode ser constituída segundo o tipo das sociedades anónimas ou de quotas, seguindo o regime jurídico geral destes tipos sociais1enquanto não é regulado especificamente em legislação especial.

O seu objecto social é necessariamente a "gestão de participações sociais de outras sociedades como forma indirecta do exercício da actividade económica."

Para que a participação numa sociedade seja considerada como forma indirecta de exercício da actividade económica, é necessário que:

- A participação seja detida por período não inferior a um ano (requisito temporal - detenção não ocasional);

- Atinja pelo menos 10% do capital com direito de voto da sociedade participada, quer directamente, quer através de sociedades em que a SGPS seja dominante2(requisito quantitativo).

Quer isto dizer que, para que haja exercício indirecto da actividade económica, não é necessário que a SGPS detenha um participação de controlo, mas apenas uma participação qualificada.

No entanto, estes requisitos conhecem excepções.

Quanto ao requisito temporal, a participação detida por período inferior a um ano não será ainda considerada ocasional se:

(i) for feita por troca; ou,

(ii) o produto da alienação for reinvestido na aquisição de participações que observem os requisitos quantitativos no prazo de 6 meses3; ou,Page 13

(iii) a participação for adquirida por uma sociedade dominada pela SGPS, ou seja, nos casos em a SGPS continua a deter a participação, mas agora de forma indirecta.

Quanto ao requisito quantitativo, prevêem-se igualmente situações em que as participações detidas possam representar menos de 10% do capital social com direito de voto. Assim, a SGPS pode deter participações inferiores aos supra mencionados 10%:

a) Se estas não representarem, no seu conjunto, uma percentagem igual ou superior a 30% do valor total das participações iguais ou superiores a 10% do capital social com direito de voto noutras sociedades;

b) Se o valor de aquisição for igual ou superior a cinco milhões de euros;

c) Se a aquisição das participações resultar de fusão ou de cisão da sociedade participada;

d) Ou se a participação ocorrer em sociedade com a qual a SGPS tenha celebrado contrato de subordinação.

E ainda permitida à SGPS a prestação de serviços técnicos de administração e gestão às sociedades em que detenham participações que cumpram os critérios temporal e quantitativo, i.e., participações detidas por período superior a um ano e representativas de pelo menos 10% do direito de voto, ou, não cumprindo estes critérios, que tenham sido adquiridas por valor igual ou superior a cinco milhões de euros ou quando a aquisição resultar de fusão ou cisão de sociedade participada.

Tal contrato de prestação de serviços deve ser reduzido a escrito, e deve indicar a correspondente remuneração.

Às SGPS é vedado, em traços largos: a) Adquirir ou manter imóveis4;Page 14

b) Alienar ou onerar participações antes de decorrido um ano sobre a sua aquisição, com as excepções tratadas supra quanto a propósito do requisito temporal (troca ou reinvestimento);

c) Conceder crédito, excepto:

i. às sociedades dela dependentes5;

ii. a sociedades em que detenham participações que observem os requisitos temporal (um ano) e quantitativo (10%);

iii. a sociedades em que detenham participações cujo valor de aquisição não seja inferior a cinco milhões de euros, ou;

iv. a sociedades em que a participação resulte da fusão ou cisão de sociedade participada.

A concessão de crédito nos termos que acabámos de expor só é permitida até ao limite do valor da participação conforme constante do último balanço aprovado, excepção feita aos casos em que é concedido crédito a sociedades dominadas pela SGPS, em que não haverá sujeição a tal limite.

Não são estabelecidos quaisquer limites para as operações de tesouraria efectuadas por sociedades em relação de domínio ou de grupo em benefício da SGPS.

Uma nota ainda para chamar a atenção para o facto de a adesão às SGPS ser um fenómeno que tem gozado de expansão significativa no mercado português, existindo, actualmente, cerca de duas mil SGPS em Portugal, estando sediadas cerca de 53% em Lisboa, 16% no Porto e 13% no Funchal (a quase totalidade na Zona Franca da Madeira). As SGPSPage 15 seguem na sua maioria o tipo de Sociedade Anónima (cerca de 70%), sendo que actualmente tem vindo a ser adoptado em número crescente o tipo de Sociedade Unipessoal por Quotas, especialmente quando detidas por empresas do sector financeiro.

2. Regime Fiscal

A nossa análise do regime fiscal das SGPS vai ser dividida em duas vertentes:

1.0 regime de eliminação da Dupla Tributação Económica de Lucros Distribuídos;

  1. A tributação das mais e menos-Valias.

2. 1 Eliminação da Dupla Tributação Económica de Lucros Distribuídos

Em termos genéricos, o regime de eliminação da dupla tributação económica dos lucros distribuídos permite, grosso modo, que uma sociedade comercial ou civil sob a forma comercial, cooperativa ou empresa pública deduza ao seu lucro tributável os lucros distribuídos pelas sociedades suas participadas, desde que estas tenham sede ou direcção efectiva em território português e sejam sujeitas e não isentas de IRÇ ou a imposto especial de jogo, ou que reunam os requisitos estabelecidos no artigo 2o da Directiva n.° 90/435/CEE, de 23 de Julho, vulgarmente designada por Directiva Sociedades-Mãe /Afiliadas (doravante designada "Directiva").

Assim sendo, este regime reveste extraordinária importância no caso das SGPS, pois os seus resultados do exercício consistem em grande medida na distribuição de lucros das suas participadas.

Vamos ver então em que termos haverá direito à aplicação deste regime de eliminação de dupla tributação económica.Page 16

Nos termos do n.° 1 do artigo 31° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (doravante "EBF"), "Às SGPS e às SCR é aplicável o disposto nos n.°s 1 e 5 do artigo 46.° do Código do IRC, sem dependência dos requisitos aí exigidos quanto à percentagem ou ao valor da participação. (Redacção dada pela Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro - OE)"

"Artigo 46.°

Eliminação da dupla tributação económica de lucros distribuídos

1 - Na determinação do lucro tributável das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, cooperativas e empresas públicas, com sede ou direcção efectiva em território português, são deduzidos os rendimentos, incluídos na base tributável, correspondentes a lucros distribuídos, desde que sejam verificados os seguintes requisitos: (Redacção dada pela Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro - OE) «¦

a) A sociedade que distribui os lucros tenha a sede ou direcção efectiva no mesmo território e esteja sujeita e não isenta de IRC ou esteja sujeita ao imposto referido no artigo 7.°; (Redacção dada pela Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro - OE)

b) A entidade beneficiária não seja abrangida pelo regime da transparência fiscal previsto no artigo 6.°; (Redacção dada pela Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro - OE)

c) A entidade beneficiária detenha directamente uma participação no capital da sociedade que distribui os lucros não inferior a 10% ou com um valor de aquisição não inferior a Euros 20.000.000,00 e esta tenha permanecido na sua titularidade, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da colocação à disposição dos lucros ou, se detida há menos tempo, desde que a participação seja mantida durante o tempo necessário para completar aquele período. (Redacção dada pela Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro - OE)

(...)Page 17

4 - O disposto no n.° 1 é igualmente aplicável, verificando-se as condições nele referidas, ao valor atribuído aos associados na amortização de partes sociais sem redução de capital e, bem assim, às sociedades gestoras de participações sociais e a outros tipos de sociedades de acordo com o Estatuto dos Benefícios Fiscais, bem como, na associação em participação, ao associado constituído como sociedade comercial ou civil sob a forma comercial, cooperativa ou empresa pública, com sede ou direcção efectiva em território português, independentemente do valor da sua contribuição relativamente aos rendimentos que tenham sido efectivamente tributados, distribuídos por associantes residentes no mesmo território. (Redacção dada pela Lei n.° 109-B/2001, de 27 de Dezembro - OE)

5 - O disposto no n.° 1 é também aplicável quando uma entidade residente em território português detenha uma participação, nos termos e condições aí referidos, em entidade residente noutro...

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