Direito da União Europeia - Directiva 2011/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 9 de Março de 2011, relativa ao exercício dos direitos dos doentes em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços

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DIRECTIVA 2011/24/UE DO PARLAMENTO

EUROPEU E DO CONSELHO

DE 9 DE MARÇO DE 2011

RELATIVA AO EXERCÍCIO DOS DIREITOS DOS DOENTES EM MATÉRIA DE CUIDADOS DE SAÚDE TRANSFRONTEIRIÇOS

O PARLAMENTO EUROPEU E O CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA, Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 114.º e o artigo 168.º,

Tendo em conta a proposta da Comissão Europeia,
Tendo em conta o parecer do Comité Económico e Social Europeu [JO C 175 de 28.7.2009, p. 116.],

Tendo em conta o parecer do Comité das Regiões [JO C 120 de 28.5.2009,
p. 65.],


Deliberando nos termos do processo legislativo ordinário [Posição do Parlamento Europeu de 23 de Abril de 2009 ( JO C 184 E de 8.7.2010, p. 368), posição do Conselho em primeira leitura de 13 de Setembro de 2010 ( JO C 275 E de 12.10.2010, p. 1), posição do Parlamento Europeu de 19 de Janeiro de 2011 (ainda não publicada no Jornal Of‌icial) e decisão do Conselho de 28 de Fevereiro de 2011.],

Considerando o seguinte:
(1) Nos termos do n.º 1 do artigo 168.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), deve ser assegurado um elevado nível de protecção da saúde na def‌inição e execução de todas as políticas e acções da União. Tal implica que terá igualmente de ser assegurado um elevado nível

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de protecção da saúde humana quando a União adoptar actos ao abrigo de outras disposições do Tratado.
(2) O artigo 114.º do TFUE constitui a base legal adequada uma vez que a maior parte das disposições da presente directiva visa melhorar o funcionamento do mercado interno e a livre circulação de mercadorias, de pessoas e de serviços. Dado que estão preenchidas as condições para a aplicação do artigo 114.º do TFUE como base legal, a legislação da União deverá assentar nesta base legal mesmo quando a protecção da saúde pública seja um factor decisivo para as opções tomadas. A este respeito, o n.º 3 do artigo 114.º do TFUE prevê de forma expressa que, ao realizar a harmonização, deve ser garantido um elevado nível de protecção da saúde humana, tendo nomeadamente em conta qualquer nova evolução com base científ‌ica.
(3) Os sistemas de saúde na União são uma componente essencial dos elevados níveis de protecção social da União, e contribuem para a coesão e a justiça sociais, bem como para o desenvolvimento sustentável. Fazem igualmente parte do quadro mais amplo dos serviços de interesse geral.
(4) Não obstante a possibilidade de os doentes receberem cuidados de saúde transfronteiriços nos termos da presente directiva, os Estados-Membros continuam a ser responsáveis pela prestação de cuidados de saúde seguros, de elevada qualidade, ef‌icazes e em quantidade suf‌iciente aos cidadãos no respectivo território. Além disso, a transposição da presente directiva para as legislações nacionais e a sua aplicação não deverão constituir um incentivo para que os doentes efectuem tratamentos fora do respectivo Estado-Membro de af‌iliação.
(5) Tal como foi reconhecido pelo Conselho nas suas Conclusões de 1 e 2 de Junho de 2006 sobre “Valores e princípios comuns aos sistemas de saúde da União Europeia” [JO C 146 de 22.6.2006, p. 1.], a seguir designadas “Conclusões do Conselho”, existe um conjunto de princípios de funcionamento comuns que são partilhados pelos sistemas de saúde em toda a União. Estes princípios de funcionamento são necessários para garantir a conf‌iança dos doentes nos cuidados de saúde transfronteiriços, que contribui para a mobilidade dos doentes, bem como para um elevado nível de protecção sanitária. Na mesma declaração, o Conselho reconheceu que o modo como esses valores e princípios comuns se traduzem na prática varia de forma signif‌icativa entre os Estados-Membros. Em

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especial, é a nível nacional que deverão ser tomadas as decisões respeitantes ao conjunto de cuidados de saúde a que os cidadãos têm direito e aos regimes para o seu f‌inanciamento e prestação, como, por exemplo, a questão de saber em que medida é apropriado recorrer aos mecanismos do mercado e às pressões da concorrência para gerir os sistemas de saúde.
(6) Tal como foi conf‌irmado em várias ocasiões pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, a seguir designado “Tribunal de Justiça”, reconhecendo embora a sua natureza específ‌ica, todos os tipos de cuidados médicos estão abrangidos pelo âmbito de aplicação do TFUE.
(7) A presente directiva respeita e não prejudica a liberdade de cada Estado-Membro decidir que tipo de cuidados de saúde considera adequado. Nenhuma disposição da presente directiva deverá ser interpretada de molde a pôr em causa as opções éticas fundamentais dos Estados-Membros.
(8) Algumas questões relacionadas com os cuidados de saúde transfronteiriços, em particular o reembolso dos custos relativos a cuidados de saúde prestados num Estado-Membro diferente do Estado-Membro em que o benef‌iciário dos cuidados reside, já foram abordadas pelo Tribunal de Justiça. A presente directiva visa assegurar uma aplicação mais geral e ef‌icaz dos princípios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça de forma avulsa.
(9) Nas Conclusões do Conselho, o Conselho reconheceu a particular utilidade de uma iniciativa no domínio dos cuidados de saúde transfronteiriços que assegure aos cidadãos da União informações claras sobre os seus direitos quando se deslocam entre Estados-Membros, a f‌im de garantir a segurança jurídica.
(10) A presente directiva tem por objectivo estabelecer regras destinadas a facilitar o acesso a cuidados de saúde transfronteiriços seguros e de elevada qualidade na União, a assegurar a mobilidade dos doentes de acordo com os princípios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça e a promover a cooperação entre os Estados-Membros em matéria de cuidados de saúde, respeitando simultaneamente as responsabilidades dos Estados-Membros no que se refere à def‌inição das prestações de segurança social no domínio da saúde e à organização e prestação de cuidados de saúde e de cuidados médicos, e de outras prestações de segurança social, em particular ligadas à doença.

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(11) A presente directiva deverá aplicar-se aos doentes que procurem receber cuidados de saúde num Estado-Membro diferente do Estado-Membro de af‌iliação. Tal como foi conf‌irmado pelo Tribunal de Justiça, nem a sua natureza especial nem a forma como estão organizados ou são f‌inanciados podem excluir os cuidados de saúde do âmbito de aplicação do princípio fundamental da livre prestação de serviços. No entanto, o Estado-Membro de af‌iliação pode optar por limitar o reembolso dos cuidados de saúde transfronteiriços por motivos que se prendem com a qualidade e a segurança dos cuidados de saúde prestados, caso isso se justif‌ique por razões imperiosas de interesse geral relacionadas com a saúde pública. O Estado-Membro de af‌iliação pode também tomar medidas adicionais com base noutros fundamentos, quando tal se justif‌ique por razões imperiosas de interesse geral. Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou que a protecção da saúde pública constitui uma das razões imperiosas de interesse geral que podem justif‌icar restrições à livre circulação prevista nos Tratados.
(12) A noção de “razões imperiosas de interesse geral” a que se referem determinadas disposições da presente directiva foi elaborada pela jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa aos artigos 49.º e 56.º do TFUE, e pode continuar a evoluir. O Tribunal de Justiça sustentou em várias ocasiões que razões imperiosas de interesse geral podem legitimar entraves à liberdade de prestação de serviços, tais como requisitos de planeamento relacionados com o objectivo de garantir um acesso suf‌iciente e permanente a uma gama equilibrada de tratamentos de elevada qualidade no Estado-Membro em questão ou com o desejo de controlar os custos e evitar, tanto quanto possível, o desperdício de recursos f‌inanceiros, técnicos e humanos. O Tribunal de Justiça reconheceu, de igual modo, que o objectivo da manutenção de um serviço médico e hospitalar equilibrado e acessível a todos pode igualmente ser abrangido por uma das derrogações, com base em razões de saúde pública, previstas no artigo 52.º do TFUE, na medida em que contribua para a realização de um nível elevado de protecção da saúde. O Tribunal de Justiça sustentou também que essa disposição do TFUE permite que os Estados-Membros restrinjam a livre prestação de serviços médicos e hospitalares, na medida em que a manutenção da capaci-dade de tratamento ou de uma especialidade médica no território nacional seja essencial para a saúde pública.

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(13) É claro que a obrigação de reembolsar os custos dos cuidados de saúde transfronteiriços deverá ser limitada aos cuidados de saúde aos quais a pessoa segurada tem direito nos termos da legislação do seu Estado-Membro de af‌iliação.
(14) A presente directiva não deverá aplicar-se aos serviços cujo objectivo principal consista em ajudar as pessoas que precisam de assistência nos actos habituais da sua vida quotidiana. Mais especif‌icamente, a presente directiva não deverá aplicar-se aos cuidados continuados considerados necessários para que a pessoa que precisa de cuidados possa ter uma vida tão plena e autónoma quanto possível. Assim, a presente directiva não deverá aplicar-se, por exemplo, aos cuidados continuados prestados por serviços de cuidados domiciliários, em residências assistidas ou em lares (“casas de saúde”).
(15) Dada a sua especif‌icidade, o acesso a órgãos e a sua atribuição para...

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